Categories: Noticias Ambientales
      Date: Ago 16, 2017
     Title: Como funciona a tecnologia que estoca energia do sol em líquidos 

André Cabette Fábio

Caso ganhe escala, produto poderia servir de alternativa a combustíveis fósseis

A ‘folha artificial’ desenvolvida por pesquisadores de Harvard
A ‘FOLHA ARTIFICIAL’ DESENVOLVIDA POR PESQUISADORES DE HARVARD



Há anos, cientistas buscam encontrar formas de estocar energia do sol de uma forma simples, que poderia servir de alternativa aos combustíveis fósseis, como o petróleo ou o gás natural. Isso porque a energia do sol é renovável e essa solução resolveria parte do problema do aquecimento global.

Ao realizar a fotossíntese, as folhas das plantas usam a energia do sol para transformar dióxido de carbono em carboidratos, que se integram a sua estrutura. A energia do sol utilizada no processo fica estocada nas ligações entre os átomos. Quando as plantas precisam de energia, elas quebram essas ligações, liberando-a.

Na fotossíntese, as plantas utilizam água, o gás carbônico e a energia do sol, e liberam o oxigênio como um subproduto. Assim como outros seres vivos, como o ser humano, para liberar a energia da glicose as plantas realizam a respiração, absorvendo o oxigênio e liberando o gás carbônico, que, por sua vez, pode vir a ser usado novamente na fotossíntese.

Por ter esse caráter de um ciclo que se completa de forma relativamente rápida, a energia obtida e estocada pela fotossíntese das plantas é considerada renovável.

Petróleo e gás natural, por sua vez, não são considerados renováveis porque demoram centenas de milhares de anos para se formar naturalmente. Substituí-los também é desejável porque, quando os utilizamos, liberamos moléculas de gás carbônico a um ritmo muito mais rápido do que a natureza é capaz de capturá-lo pelo processo da fotossíntese.

Ao explorar esses combustíveis em larga escala, a humanidade modifica coletivamente a composição química da atmosfera. Com um aumento muito grande da proporção de CO2 em um curto período de tempo, ela passa a se aquecer muito rapidamente, já que essas moléculas retêm calor — isso é o efeito estufa.

Em junho de 2016, os cientistas Daniel Nocera e Pamela Silver, que estudam ciência energética na Universidade de Harvard, descreveram em um artigo na revista Science um método que pode se tornar, futuramente, uma alternativa aos combustíveis fósseis.

Trata-se de uma espécie de folha biônica, que captura energia do sol de forma rápida, estocando-a em biomassa e biocombustíveis. A técnica foi escolhida pela revista MIT Technology Review, ligada ao Massachusetts Institute of Technology, como um dos maiores avanços em tecnologia de energia limpa de 2016. O desenvolvimento de técnicas do tipo também foi eleito pelo site do Fórum Econômico Mundial como uma das 10 tecnologias emergentes mais importantes de 2017.

O método descrito na Science inova ao aliar conhecimentos de química e biologia, e tem uma eficiência de 10%.

É uma eficiência ainda maior que a das plantas, que é de cerca de 1%. A queima desse combustível também gera gás carbônico como resíduo, mas com a vantagem de que ele poderia ser novamente absorvido utilizando o mesmo método de produção. O que significa que o combustível não aumentaria a quantidade de gás carbônico na atmosfera.

Como funciona essa tecnologia

BACTÉRIAS ESPECIAIS Os cientistas desenvolveram bactérias geneticamente modificadas, chamadas Raistonia eutropha, com características especiais para produzir o combustível

OBTENDO HIDROGÊNIO O sistema desenvolvido utiliza catalisadores feitos com uma liga de cobalto e fósforo, duas matérias-primas relativamente baratas, que, quando mergulhados na água (H2O), a divide em oxigênio (O2) e hidrogênio (H2). A pesquisa inovou porque foi capaz de fazer com que esse processo não produzisse elementos tóxicos que, em outras tentativas vinham matando as bactérias

PRODUZINDO COMBUSTÍVEL Em seguida, o sistema alimenta as bactérias com hidrogênio e gás carbônico para que elas produzam o combustível. Um reator de um litro repleto da bactéria Nocera poderia capturar 500 litros de CO2 da atmosfera por dia, como explicou Nocera em uma coletiva de imprensa concedida em 2016

O resultado desse processo é biomassa, que poderia ser queimada para a produção de energia, e biocombustíveis, como moléculas de isobutanol, além da molécula polihidroxido butirato, que pode ser usada para produzir plástico.

A própria pesquisa aponta que essa tecnologia tem potencial de ser ampliada. “Aumentar o volume do reator em dez vezes não perturbou a eficiência, o que indica que o sistema é escalável, e o volume do reator não representa um limite imediato”, como explicaram os cientistas.

Isso ainda não ocorreu, mas, na época da divulgação dos resultados, os pesquisadores avaliavam que a tecnologia seria de especial interesse para países com uma rede de distribuição de energia precária. Isso porque o método permitiria produzir e consumir energia de forma descentralizada.

Daniel Nocera afirmou naquele momento que o interesse poderia partir, por exemplo, da Índia, onde cerca de 300 milhões de pessoas não têm acesso a energia elétrica. “Há algumas pessoas influentes que eu conheço. Gostaria que eles investissem em cientistas indianos, na Índia, e que o façam [desenvolvam a tecnologia] na Índia. Esse será meu novo modelo. E vamos ver se ele funciona. Eu tenho uma descoberta legal, que agora precisa ganhar escala, mas eu quero que eles [os indianos] o façam”, disse.

 

Fonte: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/08/14/Como-funciona-a-tecnologia-que-estoca-energia-do-sol-em-l%C3%ADquidos